O Dono Dessa Porra Toda
Dia 29 de Julho. Fim do mês ou já é Agosto? Me perco nas expressões das pessoas de definir o tempo. De uns anos pra cá, dizem que tudo passa muito rápido. É dia 2 de Junho e alguém diz “Nossa já estamos em Junho” e eu sempre penso “sim, logo depois de Maio normalmente vem Junho”. E em seguida é frequente os “o ano ta passando cada vez mais rápido!”, “não consegui fazer nada esse ano”, “o Natal já está aí”. Ou então, em pleno dia 9 do mês “nossa, já acabou o mês praticamente”.
Eu sempre me questionei do porquê as pessoas dizem isso? Várias hipóteses já passaram pela minha cabeça. Pode ser apenas pra fazer conversa, um descontentamento com o ritmo em que as pessoas conquistam o que querem ou simplesmente essa sensação de fato existe. Apesar das horas continuarem com sessenta minutos, os minutos com seus 60 segundos e os segundos com seus respectivos milésimos, a percepção de tempo está acelerada.
Isso me fez lembrar de um livro que li. Falava que na física, de fato existem diferenciações. Existem três vetores de tempo. O tempo cronológico, o psicológico e o cosmológico. O tempo cronológico é definido pelo nível desordem no universo (chamado de entropia): o universo tende ao caos, ou seja, o nível de desordem é sempre crescente — tipo o meu quarto mesmo. O tempo psicológico é a nossa sensação do que é passado, presente e futuro e o tempo cosmológico é a direção do tempo em que o universo se expande ao invés de contrair. Aí eu penso, se esses cientistas super inteligentes¹ descobriram que existem maneiras de interpretar o dono dessa porra toda de maneiras diferentes, é bem possível que a nossa vida e o que fazemos dela, possa influenciar a nossa percepção também.
Viajando um pouco na maionese esses dias, eu estava tomando café da manhã com a minha irmã. Pão com manteiga, geléia, queijo e café com leite. Era um dia de sol e eu queria sair de casa. O vento era quente, mas me refrescava conforme remexia as folhas das árvores e das plantas em vasos da minha mãe. Darly queria comprar presente pro aniversário de uma amiga e pediu carona. Contrariando o hábito de sempre contrariar, eu aceitei.
Chegando no shopping eu via muita gente. Bem arrumada, diferente mas ao mesmo tempo todas iguais. Eu estava de calça larga, tênis e sem sutiã. Não via propósito em me arrumar pra ir num shopping fazer compras, apesar da maior parte das pessoas ali estarem bem produzidas. Acompanhava minha irmã presente em corpo mas distante em pensamento. O movimento aflito das pessoas me incomodava. Eu não me sentia bem ali, me sentia caçada. Entre algumas histórias de cursinho pré-vestibular da minha irmã e a terceira loja de roupas uma mulher nos aborda de repente:
— Vocês sabem se tem número 35? Enquanto chacoalhava um par de sapatos preto de salto brilhosos pra gente. De imediato eu disse:
— Não trabalhamos aqui. A notícia pareceu ter pego a mulher de meia idade de surpresa no que arregalou os olhos deu um passo atrás e começou a procurar vendedores pela loja. Darly me olhou e disse “você acha que estamos parecendo vendedoras” e eu disse “nem um pouco. mulher estranha”. Ao andarmos pela loja, mantive meus olhos naquela mulher. Ela experimentava todos os pares que via entre olhadas no celular e risos. Um mais desconfortável que o outro, uma risada mais alta que a outra. Darly me tirou da concentração de tal forma que dei um pulo quando me perguntou — Que tá olhando, Alice?. Quando me vi, estava escondida entre a gondola de cintos e cachecóis espiando. — Nada, to olhando aquela moça meio doida. — Ela é doida mesmo, deixa. Me ajuda escolher, o que combina mais com a Ka? Forcei o foco pra ajudar a minha irmã enquanto não tirava os olhos da mulher. Darly escolheu a blusa preta com lantejoulas, a mulher escolheu o celular nos 15 minutos seguintes que permanecemos na loja.
No caminho de casa me pus a pensar se aquela senhora diria alguma daquelas frases de que o tempo passa muito rápido pra alguém. Ela não estava presente no momento pra escolher os próprios sapatos. Dividia a atenção com outras pessoas e procrastinava o que de fato a levou até ali. Acho que vou escrever uma carta pros amigos cientistas do senhor Stephen Hawking e contar que tenho uma informação pra continuação dos seus estudos póstumos. Existe entropia no tempo psicológico também. O caos que as próprias pessoas criam em suas próprias vidas impedindo-as de fazer suas coisas e depois colocam a culpa no tempo. Coitado, mal sabe ele.
¹Hawking, S. (n.d.). A Brief History of Time.